MAIS DE 45 ANOS PRESTANDO SERVIÇOS COM QUALIDADE

A RESTRIÇÃO AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE SUB-ROGAÇÃO DO SEGURADOR E OS IMPACTOS NEGATIVOS PARA O SISTEMA PRIVADO DE SEGUROS BRASILEIRO.

23/04/2024

O presente artigo explora o Projeto de Lei 1738/22 que propõe modificações no Código Civil, além de destacar a importância da sub-rogação no setor de seguros e evidenciar seu papel na sustentabilidade das seguradora
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

 

Entende-se por sub-rogação nesse contexto o direito que a seguradora possui de recuperar do responsável pelo dano o montante que ela desembolsou ao segurado, conforme estabelecido no Art. 786 do Código Civil.

De todo modo, recentemente o deputado Lucio Mosquine apresentou a Câmara dos Deputados o projeto de Lei n° 1738/22 que propõe modificações no Art.786 Código Civil e no direito à sub-rogação das seguradoras.

Os argumentos expostos dizem que a lei vigente é injusta, pois permite que a seguradora lucre em duas frente distintas: ao cobrar o prêmio no momento da contratação do seguro e ao reaver o valor pago ao cliente, através de sua ação de regresso.

A proposta de lei agiria no sentido de restringir a aplicação desse direito, isto é, propõe que a sub-rogação tenha efeito apenas aos casos em que os terceiros tenham agido de forma intencional ao causar prejuízos ao segurado.

Frente a essa questão, é importante destacar outras perspectivas, acerca da relevância da manutenção do direito das seguradoras, bem como mensurar eventuais impactos que se originariam dessas modificações.

A sub-rogação nos contratos de seguro é um mecanismo legítimo e crucial para garantir o mutualismo subjacente ao sistema. A possibilidade de recuperar os valores desembolsados em caso de danos causados por terceiros compõe o cálculo estatístico atuarial do prêmio, permitindo que as seguradoras estabeleçam taxas justas e viáveis.

Sem essa possibilidade de regresso, o ônus financeiro recairia inteiramente sobre a empresa seguradora, impactando diretamente os preços dos prêmios e, por conseguinte, os consumidores. Portanto, a sub-rogação não apenas protege as seguradoras, mas também mantém a sustentabilidade do sistema de seguro como um todo.

De forma sucinta, a sub-rogação não implica em dupla lucratividade, pois o prêmio é calculado considerando o risco assumido pela seguradora e a sub-rogação mitiga esses riscos, evitando ajustes nos prêmios. Se ausente, poderia levar a prêmios mais altos, prejudicando a relação mutual.

Não obstante, existe um aspecto social intrínseco nesse direito, que é, em sua essência um princípio de justiça financeira, pois permite que o causador do dano, seja por negligência ou intencionalmente, seja responsabilizado pelos prejuízos causados, evitando que seja beneficiado injustamente das despesas pagas pela seguradora.

Conforme dados da PRF, a principal razão por trás dos acidentes com morte nas rodovias federais do país não está vinculada a condutas intencionais e premeditadas, mas sim, a falta de atenção ou reação dos motoristas, motociclistas e pedestres (36% dos casos), o desrespeito às normas de trânsito (14,4% dos casos), a velocidade excessiva (10% dos casos) e até mesmo consumo de álcool (5% dos casos).

Na impossibilidade de aplicação da sub-rogação o efeito gerado pode acarretar em um incentivo para que terceiros cometam atos negligentes ou deliberados, sem o temor das consequências financeiras, sendo que para exemplificar podemos trazer esse conceito a uma situação cotidiana.

Podemos considerar uma situação em que o segurado está conduzindo seu veículo de maneira apropriada quando, inesperadamente, ocorre uma colisão com outro veículo. Trata-se de um acidente que não resultou de intenção deliberada, mas sim da negligência do motorista do outro veículo, que estava distraído enquanto dirigia ou que desrespeitou alguma norma na condução de seu veículo.

Sendo portador de um seguro automóvel que cobre danos ao veículo segurado existe a possibilidade de realizar a abertura de aviso de sinistro, hipótese em que a seguradora irá arcar com os custos do reparo e, atualmente, após identificar a responsabilidade do terceiro, poderá exercer o direito de sub-rogação e buscar reaver os custos do dano que arcou no reparo perante o motorista terceiro que foi negligente.

Considerando, todavia, uma situação hipotética em que a sub-rogação é restringida, após o acionamento do seguro e da realização de todos os reparos pela seguradora, devido à ausência de sub-rogação, a seguradora não pode buscar reaver os custos junto ao terceiro negligente, pois mesmo que tenha agido com negligência, não possuía a intenção direta de causar os dados.

Essa ausência de responsabilidade financeira direta contradiz os princípios estabelecidos nos artigos 186 e 927 do Código Civil. De acordo com esses dispositivos, qualquer indivíduo que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viole os direitos de outrem e cause danos, mesmo que exclusivamente morais, comete um ato ilícito. Além disso, aquele que praticar tal ato ilícito e causar danos a terceiros é legalmente obrigado a repará-los.

Consequentemente, essa deficiência na atribuição de responsabilidade econômica diretamente relacionada ao fato pode levar a uma diminuição do senso de responsabilidade por parte dos motoristas. Eles podem não se sentir tão incentivados a adotar práticas de condução mais seguras, como evitar distrações no trânsito ou seguir rigorosamente as normas de trânsito. Esse cenário, por sua vez, poderia contribuir para um aumento nos acidentes de trânsito e comprometer a segurança nas vias públicas.

Conclui-se, portanto, que a sub-rogação no contexto não deve ser vista como uma busca de lucro por parte das seguradoras, mas sim como um mecanismo legítimo que promove a mutualidade nas relações de seguro, a justiça financeira e responsabiliza aqueles que causam danos, intencionalmente ou não. Ela desempenha um papel crucial na manutenção do equilíbrio no sistema de seguros e na proteção dos interesses dos segurados, ao mesmo tempo em que promove um ambiente mais seguro em vários âmbitos, como no trânsito, razão pela qual o projeto de lei proposto pelo deputado Lucio Mosquine não deve prosperar.

 

_________________________

https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2329978#:~:text=PL%201738%2F2022%20Inteiro%20teor,Projeto%20de%20Lei&text=Altera%20o%20art.,que%20paga%20indeniza%C3%A7%C3%A3o%20ao%20segurado.

https://www.ipea.gov.br/portal/categorias/45-todas-as-noticias/noticias/13899-estudo-aponta-aumento-de-13-5-em-mortes-no-transito

https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10686311/artigo-786-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-2002

https://www.gov.br/susep/pt-br/central-de-conteudos/glossario

 

_________________________

 

GLOSSÁRIO

Aviso de sinistro: Comunicação da ocorrência de um sinistro que o Segurado é obrigado a fazer à Seguradora, assim que dele tenha conhecimento. (Circular SUSEP 321/06).

Dano: No seguro, é o prejuízo sofrido pelo Segurado e indenizável ou não, de acordo com as condições do contrato de seguro. (Circular SUSEP 354/07).

Imprudência: Definição do ato praticado sem cautela, ou de forma imoderada, ou, ainda, desprovido da preocupação de evitar erros ou enganos. Se, em decorrência da ação (ou omissão) imprudente, for, involuntariamente, violado direito e causado dano, o responsável terá cometido um ato ilícito culposo. A ação (ou omissão) imprudente, que não causa danos, não é ato ilícito. Como exemplos de ações imprudentes podemos citar: dirigir, à noite, com faróis apagados ou deficientes, ou carregar um caminhão com carga de peso superior ao limite máximo legal. (RESOLUÇÃO CNSP Nº 341/2016).

Negligência: Omissão, descuido ou desleixo no cumprimento de encargo ou obrigação. Se, decorrente da negligência, e de forma involuntária, houver violação de direito e for causado dano, o responsável terá cometido ato ilícito culposo. Exemplo: funcionário que extravia documento sob sua guarda. A negligência desacompanhada de danos não é ato ilícito. Exemplo: caixa que recebe depósito em espécie sem conferir, verificando depois estar o mesmo correto. (RESOLUÇÃO CNSP Nº 341/2016).

Prêmio: Importância paga pelo Segurado ou estipulante/proponente à Seguradora para que esta assuma o risco a que o Segurado está exposto. (Circular SUSEP 306/05).