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Embriaguez exime o dever de indenizar no seguro de vida. Reorientação do STJ

12/08/2022

Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão, propõe interpretação adequada à súmula 620 admitindo a perda de direito do segurado na hipótese da embriaguez ter contribuído decisivamente para o agravamento de risco. 

 


Em 2018, a Segunda Seção do STJ editou a súmula 620, segundo a qual “a embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”.

 

A interpretação e aplicação leviana do enunciado, sem atenção aos precedentes que lhe deram origem, conduziram ao entendimento equivocado de que em hipótese nenhuma, no seguro de vida, o segurado perderia direito à indenização caso sofresse sinistro embriagado.

 

Embora evidente o contrassenso de tal interpretação com apelo social do tema “embriaguez ao volante” – de um lado as políticas públicas e a sociedade clamando cada vez mais por maior repressão e, de outro, a súmula dando margem à interpretação de que não haveriam consequências ao segurado que assumir o risco de conduzir embriagado – a aplicação desavisada do enunciado se alastrou perante os Tribunais locais e o debate se instaurou novamente no STJ, a menos de quatro anos da publicação da súmula.

 

Trata-se do REsp 1.999.624/PR, afetado por unanimidade pela Quarta Turma à Segunda Seção, e que teve o julgamento iniciado em 10/08/2022.

 

Na fundamentação de seu voto asseverou o Ministro Relator, Luis Felipe Salomão, que o enunciado sumular diz menos do que a Segunda Seção tem compreensão da matéria, “circunstância com indiscutível potencial para induzir a aplicação equivocada da jurisprudência desta Casa”.

 

Com o propósito de orientar corretamente a aplicação da jurisprudência, o Ministro propôs o seguinte: “no seguro de vida a embriaguez do segurado que conduz veículo automotor e se envolve em acidente, por si só, não exime o segurador do pagamento de indenização, sendo necessária a prova de que aquela conduta configurou agravamento do risco segurado, com ônus da prova pelo segurador, influindo decisivamente na ocorrência do sinistro”.

 

Muito embora o julgamento fora interrompido em razão do pedido de vista do Ministro Raul Araújo, o Relator também propôs o encaminhamento de cópia do acórdão à comissão de jurisprudência da Corte Superior para eventual revisão do enunciado da súmula 620, na forma do art. 44 e seguintes do Regimento Interno1.

 

O que se denota, portanto, é que o STJ se encaminha para orientar adequadamente a aplicação da súmula 620 no sentido de que o segurado que agravar o risco ao conduzir veículo embriagado, e nesta condição, der causa ao sinistro, poderá perder o direito à indenização também no seguro de vida – diz-se “também” porque já é pacífico no STJ a perda de direitos na hipótese de seguro de automóvel.

 

Isto é, no seguro de vida o Segurador pode ser isentado de pagar a indenização ao segurado ou seus beneficiários se comprovar, no caso concreto, que a embriaguez influiu decisivamente no agravamento do risco e eclosão do sinistro.

 

A esperada evolução da jurisprudência neste ponto, consagrada com o início do julgamento do caso em destaque, é altamente relevante a fim de alinhar o entendimento do tema com os esforços nacionais de combate ao panorama epidemiológico dos acidentes de trânsito causados por embriaguez, evitando-se assim que a aplicação objetiva do enunciado sumular sirva de estímulo à conduta nefasta e reprovável de conduzir veículo automotor embriagado.

 

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1 Art. 44. À Comissão de Jurisprudência cabe:
I – velar pela expansão, atualização e publicação da súmula da jurisprudência predominante do Tribunal;
II – supervisionar os serviços de sistematização da jurisprudência do Tribunal, sugerindo medidas que facilitem a pesquisa de julgados ou processos;
III – orientar iniciativas de coleta e divulgação dos trabalhos dos Ministros que já se afastaram definitivamente do Tribunal;
IV – propor à Corte Especial ou à Seção que seja compendiada em súmula a jurisprudência do Tribunal, quando verificar que as Turmas não divergem na interpretação do direito;