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Exceção ao princípio da unirrecorribilidade. Agravo em Recurso Especial, em certas circunstâncias, deverá ser interposto simultaneamente com Agravo Interno, sob pena de não conhecimento dos recursos por falta de impugnação específica.

10/05/2024

O Processo Civil, assim como todas as áreas do Direito, possuí exceções às suas regras. Uma delas é a possibilidade/necessidade de interposição simultânea de dois Recursos em face da decisão que não admite o Recurso Especial: Agravo em Recurso Especial e o Agravo Interno.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

 

No Brasil, existem diversas fontes de direito, podendo ser tanto escritas como não escritas. Uma destas fontes não escritas, isso é, que não estão expressamente previstas em lei, são os princípios.

Com efeito, um dos princípios que rege o Processo Civil brasileiro é o da unirrecorribilidade. Tal como definiu a Ministra Nancy Andrighi, no julgamento do Recurso Especial Nº 1.628.773 – GO, trata-se da premissa de que, para cada decisão a ser atacada, há um único Recurso cabível e previsto no ordenamento jurídico.

O referido princípio não é absoluto e possui exceções. Algumas, inclusive, previstas em lei. Por exemplo, a possibilidade de interposição simultânea de Recurso Especial e Recurso Extraordinário (arts. 1.029 e 1.030, ambos do CPC/15), em face de Acórdão proferido por Tribunal Estadual, na hipótese em que se busca discutir tanto a ofensa de lei federal (Recurso Especial) como da Constituição Federal (Recurso Extraordinário).

Embora essa provavelmente seja a hipótese mais conhecida dos operadores do direito quanto à exceção do princípio da unirrecorribilidade, ela não é única. Poderá exsurgir a necessidade de interposição de dois Recursos em face, também, da decisão monocrática de inadmissibilidade do Recurso Especial proferida pelo Presidente, ou Vice-Presidente do Tribunal Estadual.

Com o advento do Código de Processo Civil extirpou-se, em regra, o duplo juízo de admissibilidade na maioria dos Recursos. Porém, o Recurso Especial não foi um deles. Por essa razão, interposto o Recurso Especial, o primeiro juízo de admissibilidade é feito pelo Presidente ou Vice-Presidente do Tribunal que proferiu a decisão guerreada (art. 1.030, CPC/15).

Na maioria das hipóteses, será cabível o Agravo em Recurso Especial em face da decisão de inadmissibilidade (art. 1.042, CPC/15). Diz-se maioria pois, caso a decisão monocrática paute-se na conformidade entre o Acórdão recorrido e entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado em sede de Recurso Repetitivo (art. 1.030, I, b, CPC/15), caber-se-á Agravo Interno (art. 1.030, §2º, CPC/15), e não Agravo em Recurso Especial.

Ocorre que, não raras vezes, a decisão monocrática poderá ser fundamentada tanto na existência de Acórdão proferido em sede de Recurso Repetitivo, quanto outros fundamentos para negar seguimento ao Recurso Especial. Nessa hipótese, depara-se com uma decisão e dois Recursos cabíveis, tanto o Agravo Interno como como o Agravo em Recuso Especial.

Essa conclusão se dá, especialmente, em virtude da interpretação dada pelo STJ à decisão de inadmissibilidade do Recurso Especial, a qual visa apenas apreciar os pressupostos de admissibilidade Recursal e, portanto, não seria possível admitir que nela existam capítulos autônomos.

Por essa razão, considerando: a) a possibilidade de concorrência de diversos fundamentos para a inadmissibilidade do Recurso Especial, sendo um deles, a existência de Acórdão proferido sob o Regime de Recuso Repetitivos; b) a unicidade da decisão monocrática, isso é, ausência de capítulos autônomos e; c) necessidade de impugnação de todos os fundamentos que deram azo ao não recebimento do Recurso; chega-se à conclusão da necessidade de interposição simultânea do Agravo Interno e Agravo em Recurso Especial, a fim de que a decisão seja adequadamente atacada, afastando-se, assim, qualquer possibilidade de preclusão.

Nos termos do que ensina Nelson Nery:

Para contestar uma decisão que bloqueia o trânsito a um recurso excepcional, que ao mesmo tempo trata de questões sistemáticas de recursos repetitivos ou de repercussão geral (art. 1030, I, do CPC) e questões relacionadas à admissibilidade recursal (art. 1030, V, do CPC), a parte derrotada deve simultaneamente interpor um agravo interno (art. 1021 do CPC) se o foco for a parte sobre recursos repetitivos ou repercussão geral, e um agravo em recurso especial/extraordinário (art. 1042 do CPC) se a questão for a inadmissão por falta dos pressupostos recursais.

Esta questão, aliás, já foi debatida pelo próprio STJ na Corte Especial, no julgamento do AgInt no RE no AgInt nos EAREsp 1291021 / SP. Assim foi decidido naquela ocasião: “a decisão que nega seguimento e inadmite em parte o apelo extremo, possui natureza híbrida e, portanto, desafia a interposição simultânea de agravo interno e agravo em recurso extraordinário, ex vi do artigo 1.030, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil”

Embora o excerto acima verse a respeito do Agravo em Recurso Extraordinário, a conclusão é aplicável a ambos os Recursos para as instâncias superiores. No julgamento do AgRg no AREsp n. 1.875.440/SP em 19/10/2021, DJe de 22/10/2021., o relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), junto à Sexta Turma, delimitou a referida exceção do princípio da unirrecorribilidade nas seguintes palavras:

“O Código de Processo Civil estabelece o cabimento de agravo interno para impugnar a aplicação da sistemática dos recursos repetitivos, a ser julgado pelo órgão colegiado do Tribunal a quo (art. 1.030, § 2º, c/c art. 1.021); e do agravo, previsto no art. 1.042, relativamente às demais questões, este de competência da Superior Instância, importando, assim, exceção ao princípio da unirrecorribilidade e, por consequência, inaplicabilidade do princípio da fungibilidade recursal.”

Inclusive, da leitura da decisão acima mencionada, tem-se que é incabível a aplicação do princípio da fungibilidade quando da interposição equivocada do Recurso ou pela não interposição de um deles, por constituir erro grosseiro.

A decisão, proferida pela Sexta Turma, além de respaldada pelo Acórdão prolatado pela Corte Especial do STJ alhures mencionada (AgInt no RE no AgInt nos EAREsp 1291021 / SP), também é referendado por arestos da Segunda Turma (AgInt no AREsp 1635740/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2021, DJe 13/08/2021), Terceira Turma (AgInt no AREsp 1737230/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/08/2021, DJe 18/08/2021), Quarta Turma (AgInt no AREsp 1746550/PE, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2021, DJe 23/04/2021) o que demonstra a consonância entre os julgadores do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema.

Dessa forma, verifica-se que existem exceções ao princípio da unirrecorribilidade expressamente previstas em lei, e uma delas é a simultaneidade entre o Agravo Interno e o Agravo em Recurso Especial na impugnação à decisão monocrática de inadmissibilidade do Recurso Especial, nos termos do artigo 1.030, § 2º do CPC/15, o que revela a necessidade de atenção redobrada pelos operadores do direito, a fim de que a decisão seja adequadamente impugnada, evitando-se prejuízos aos clientes na obtenção da tutela jurisdicional almejada.

 

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https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ITA?seq=1828934&tipo=0&nreg=201602551700&SeqCgrmaSessao=&CodOrgaoJgdr=&dt=20190524&formato=PDF&salvar=false#:~:text=O%20princ%C3%ADpio%20da%20singularidade%2C%20tamb%C3%A9m,adequado%20previsto%20no%20ordenamento%20jur%C3%ADdico.

Art. 1.029. O Recurso extraordinário e o Recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão:

Art. 1.031. Na hipótese de interposição conjunta de Recurso extraordinário e Recurso especial, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III – julgar, em Recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face de lei federal;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) 

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (…)

II – julgar, mediante Recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Art. 1.030. Recebida a petição do Recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:

Art. 1.042. Cabe agravo contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que inadmitir recurso extraordinário ou recurso especial, salvo quando fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos.             (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)

I – negar seguimento: (…)

b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos. (Incluída pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)

§ 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021.             (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. ART. 544, § 4º, I, DO CPC/1973. ENTENDIMENTO RENOVADO PELO NOVO CPC, ART. 932.

1. No tocante à admissibilidade recursal, é possível ao recorrente a eleição dos fundamentos objeto de sua insurgência, nos termos do art. 514, II, c/c o art. 505 do CPC/1973. Tal premissa, contudo, deve ser afastada quando houver expressa e específica disposição legal em sentido contrário, tal como ocorria quanto ao agravo contra decisão denegatória de admissibilidade do recurso especial, tendo em vista o mandamento insculpido no art. 544, § 4º, I, do CPC, no sentido de que pode o relator “não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada” – o que foi reiterado pelo novel CPC, em seu art. 932.

2. A decisão que não admite o recurso especial tem como escopo exclusivo a apreciação dos pressupostos de admissibilidade recursal. Seu dispositivo é único, ainda quando a fundamentação permita concluir pela presença de uma ou de várias causas impeditivas do julgamento do mérito recursal, uma vez que registra, de forma unívoca, apenas a inadmissão do recurso. Não há, pois, capítulos autônomos nesta decisão.

3. A decomposição do provimento judicial em unidades autônomas tem como parâmetro inafastável a sua parte dispositiva, e não a fundamentação como um elemento autônomo em si mesmo, ressoando inequívoco, portanto, que a decisão agravada é incindível e, assim, deve ser impugnada em sua integralidade, nos exatos termos das disposições legais e regimentais. 4. Outrossim, conquanto não seja questão debatida nos autos, cumpre registrar que o posicionamento ora perfilhado encontra exceção na hipótese prevista no art. 1.042, caput, do CPC/2015, que veda o cabimento do agravo contra decisão do Tribunal a quo que inadmitir o recurso especial, com base na aplicação do entendimento consagrado no julgamento de recurso repetitivo, quando então será cabível apenas o agravo interno na Corte de origem, nos termos do art. 1.030, § 2º, do CPC. 5. Embargos de divergência não providos. (EAREsp 831.326/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/09/2018, DJe 30/11/2018).

JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/codigo-de-processo-civil-comentado/1506549897