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Comentários à Súmula 616 – Para negativa de cobertura, é necessária a notificação do segurado sobre suspensão do contrato de seguro por inadimplência

21/12/2018

Recentemente, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça editou nova súmula versando acerca do dever de indenizar quando ausente a comunicação prévia do segurado sobre o atraso no pagamento do prêmio, entendendo a impossibilidade do desfazimento automático do contrato, tendo em vista os preceitos tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor.

Tal entendimento se originou a partir do julgado em ação proposta contra determinada seguradora que negou a cobertura do sinistro do segurado alegando o cancelamento do contrato em razão de atraso havido em uma das prestações do prêmio.

No caso sub examen, após a improcedência da ação em primeira instância, o Primeiro Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo manteve a decisão em fase recursal, em consonância com o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 323.251 (SP), que havia manifestado na oportunidade não ser devida indenização decorrente de contrato de seguro durante o período de mora.

Neste contexto, faz-se mister salientar que, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a matéria gerou diversas discussões e decisões conflitantes até a publicação da Súmula 616.

Em oportunidade anterior, a 4ª Turma do Superior Tribunal já havia decidido pela impossibilidade de recusa no pagamento de indenização, com base no argumento do adimplemento substancial e entendendo que a resolução contratual, ensejada por qualquer motivação, só poderia se dar em juízo.

De maneira mais branda, todavia, entendeu o ministro Aldir Passarinho Junior, relator do REsp 316.552 (SP) – julgado que ensejou a Súmula 616 que, apesar de o mero atraso no pagamento da prestação do prêmio não ensejar o desfazimento automático do contrato e, portanto, não permitir a negatória na cobertura, bastaria a prévia constituição do segurado em mora, mediante interpelação, para a validação da recusa da cobertura da indenização.

É necessário compreender que a postura tomada pelo Superior Tribunal de Justiça, por intermédio do voto do ministro Aldir Passarinho e da Súmula 616, tomou um viés muito mais flexível que os posicionamentos anteriores.

Ora, é inegável que atrelar a resolução dos contratos trazidos à baila à via judicial seria exageradamente oneroso às seguradoras, que teriam de recorrer ao Judiciário em todos os casos de inadimplemento de alguma das parcelas do prêmio para fazer valer a possibilidade legal de suspensão do contrato.

De igual modo, a automática resolução de contrato em caso de mora do segurado é ilícita, como elucida Pedro Alvim (2001, p. 291 apud STJ, 2018, online), uma vez que ofende os preceitos tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor, que define serem nulas de pleno direito cláusulas que autorizem o contratado a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao contratante.

Em sentido diverso, a suspensão do contrato de seguro é medida cabível e expressamente admitida pelo art. 12 do Decreto-Lei 73/66, que dispõe que “a obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia previsto na apólice ou bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro até o pagamento do prêmio e demais encargos”.

Todavia, apesar da previsão legal e possibilidade de suspensão do contrato em razão da inadimplência do segurado, a constituição em mora através de interpelação pelo contratado é medida exigida a partir da interpretação jurisprudencial exarada pela Corte.

Este, inclusive, foi o posicionamento tomado pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), na circular n. 67, que determina sobre os contratos de seguro em seu art. 3º:

Art. 3º – Ao término do prazo estabelecido pelo art. 1º, sem que haja o restabelecimento facultado pelo art. 2, a apólice ficará cancelada após a notificação do segurado, com antecedência mínima de quinze dias.”

No mesmo sentido, asseverou a ministra Nancy Andrighi, no voto que acompanhou o relator no REsp 316.552 (SP):

(…) a exigência de que o segurado seja devidamente interpelado para que, só então, cientificado de seu atraso e da consequência jurídica, seja considerado em mora para fins de suspensão da cobertura, mostra-se conciliadora e razoável.

No entanto, por estima à discussão, há de se salientar que, apesar de mais flexível que as decisões anteriores, o entendimento do Tribunal que exige a interpelação do segurado acaba por ferir o posicionamento legislativo em relação à constituição de mora. Preceitua o Código Civil vigente, em seu art. 394:

Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

E também em seu art. 397:

Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.

Ora, a legislação prevê que se considera em mora o devedor que não efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma convencionados. A lei, neste tocante, define expressamente a situação que constitui a mora: inadimplemento da obrigação.

Deste feito, independente da interpelação, em mora se encontraria o segurado que deixasse de pagar o prêmio no tempo estipulado contratualmente. Uma vez em mora, pela lógica, não restaria devida a indenização, enquanto durasse o período de mora.

No entanto, a interpretação solidificada pela Corte através da Súmula 616 deve passar a ser devidamente observada pelas seguradoras, de modo a garantir a devida segurança jurídica nas transações e decisões tomadas pelas empresas.

REFERÊNCIAS

ALVIM, Pedro. Contrato de Seguro. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

STJ. RECURSO ESPECIAL : REsp 323.251 SP 2001/0039883-9. Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior. Julgado: 26/06/2002. Disponível em: < https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/9014652/recurso-especial-resp-316552-sp-2001-0039883-9?ref=juris-tabs>. Acesso em: 25 set. 2018.

STJ. SUMULA 616. Publicação: 28/05/2018. Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2018_47_capSumulas616.pdf>. Acesso em: 25 set. 2018.