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Patrimônio de afetação e alienação fiduciária de bem imóvel: implicações para credores e expansão de possibilidades sob a égide do Marco Legal das Garantias

29/05/2024

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

 

No dinâmico setor da construção civil, a segurança jurídica e financeira dos investimentos é fundamental. Para os credores, especialmente instituições financeiras, compreender as alternativas para concessão de crédito, através de alienação fiduciária, consubstanciada em garantias imobiliárias com registro de afetação de patrimônio, torna-se essencial para garantir a segurança jurídica e promover o desenvolvimento econômico sustentável.

Com a introdução do Marco Legal das Garantias (Lei n.o 14.711/23), o panorama para essa modalidade de crédito evoluiu, oferecendo novas possibilidades e maior segurança nas operações vinculadas a projetos imobiliários.

Este estudo busca aguçar, mas não esgotar, os panoramas gerais sobre o tema, analisando aspectos do patrimônio de afetação e as possíveis soluções para as instituições financeiras na
concessão de crédito, sobretudo sob a égide das atualizações legislativas em matéria de Direito Imobiliário.

Patrimônio de afetação: conceitos e legislação

O patrimônio de afetação se constitui em instituto jurídico que isola os ativos e receitas de um determinado projeto imobiliário do restante do patrimônio do incorporador.
Instituído pela Lei no 4.591/64 e expandido pela Lei no 10.931/04, esse mecanismo garante que os recursos destinados a um empreendimento sejam utilizados exclusivamente para sua finalização, protegendo assim os interesses dos credores e terceiros, mediante registro na averbação do imóvel no Registro de Imóveis competente (art. 31-B da Lei no 4.591/64)1 .

Este regime não só aumenta a transparência nas operações, como também minimiza os riscos de crédito ao vincular o financiamento diretamente aos ativos do projeto. A incerteza, no entanto, subsiste quanto à possibilidade de alienação fiduciária de imóveis com registro de afetação de patrimônio, bem como a definição dos direitos do credor fiduciário nessas situações.

Alienação fiduciária e patrimônio de afetação

É notório que, a alienação fiduciária, permite ao credor manter a posse indireta de determinado bem até a resolução do negócio jurídico (art. 22 da Lei n.o 9.514/97) 2 , estabelecendo-se assim como mecanismo jurídico e econômico seguro para as instituições financeiras, além de apresentar-se vantajosa para os beneficiários do crédito imobiliário.

Especificamente, em empreendimentos submetidos ao regime de patrimônio de afetação, a alienação fiduciária – na medida da afetação – possui condição específica, e assim, somente poderá ser objeto de alienação fiduciária na hipótese do financiamento obtido for aplicado e destinado diretamente em proveito ao próprio empreendimento (art. 31-A, § 3o da Lei no 4.591/64)3 .

Essa especificidade assegura que as instituições financeiras possam estruturar seus financiamentos com uma compreensão clara dos riscos e das garantias associadas. Tal abordagem não só fortalece a segurança jurídica e financeira do crédito imobiliário, mas também sustenta a integridade e a finalidade do patrimônio de afetação, consolidando a confiança mútua entre incorporadores, credores e terceiros.

Neste ponto, é relevante questionar quais outras alternativas estariam disponíveis para os credores – e também incorporadores – a fim de viabilizar o crédito imobiliário com segurança e benefícios econômicos.

Marco Legal das Garantias e as expansões das possibilidades dos credores em garantia com patrimônio de afetação de incorporadores

A Lei n.o 14.711/23, comumente conhecida como Marco Legal das Garantias, amplia significativamente as opções de garantia. Esta legislação permite a alienação fiduciária parcial
de imóveis, facilitando o uso de partes específicas de um projeto como garantia, sem comprometer a totalidade do patrimônio.

Tal inovação é essencial para credores e devedores ajustarem as garantias conforme o binômio necessidade/possibilidade do incorporador e o montante do crédito envolvido.
Sob o marco legal, a legislação agora reconhece a possibilidade de sucessivas alienações fiduciárias sobre o mesmo bem, permitindo mais de uma averbação do instituto em uma única garantia – múltiplas alienações autônomas e sucessivas para um único bem (art. 22, § 4o da Lei n.o 9.514/97 com alteração dada pela Lei n.o 14.711/23) 4.

Além disso, as modificações introduzem o conceito de extensão (também denominada de “recarregamento”) da garantia, conforme artigos 9-A5 a 9-D da Lei no 13.476/17, permitindo que
uma mesma garantia real cubra múltiplas obrigações entre as mesmas partes, sem que haja a perda da afetação entre as consecutivas alienações.

As novidades legislativas introduzidas pelo Marco Legal das Garantias expandem significativamente as estratégias disponíveis para os credores concederem crédito de maneira
segura. A possibilidade de sucessão ou extensão da alienação fiduciária não apenas aumenta a segurança nas operações de crédito, mas também garante flexibilidade e oportunidades para as
incorporadoras. Isso é crucial para que elas obtenham financiamento adequado às suas necessidades, sem comprometer a integridade do projeto ou a garantia creditícia da instituição
financeira.

Conclusão

Para as instituições financeiras, é essencial compreender o patrimônio de afetação, suas regras e nuances, bem como a possibilidade de alienação fiduciária e as alterações introduzidas pelo
Marco Legal das Garantias. Tal compreensão assegura uma base sólida para a oferta de crédito no setor imobiliário, permitindo uma alocação eficiente de recursos com um nível de risco adequadamente gerenciado.

Com as alterações promovidas pela Lei n.o 14.711/23, as instituições financeiras estão agora adequadamente capacitadas para alocar recursos de crédito em projetos de incorporação imobiliária. Anteriormente, a falta de segurança jurídica ou de disposições legais adequadas poderia comprometer tais investimentos; no entanto, com as atualizações, há mais segurança nesse sentido, habilitando as instituições financeiras a contribuir decisivamente para o crescimento sustentável do mercado imobiliário.

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1 Art. 31-B. Considera-se constituído o patrimônio de afetação mediante averbação, a qualquer tempo, no Registro de
Imóveis, de termo firmado pelo incorporador e, quando for o caso, também pelos titulares de direitos reais de aquisição
sobre o terreno.

2 Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o fiduciante, com o escopo de garantia
de obrigação própria ou de terceiro, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa
imóvel

3 Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e
as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão
apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação
correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.
(…)
§ 3o Os bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação somente poderão ser objeto de garantia real em operação
de crédito cujo produto seja integralmente destinado à consecução da edificação correspondente e à entrega das
unidades imobiliárias e de suas pertenças aos respectivos adquirentes.

4 Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o fiduciante, com o escopo de garantia
de obrigação própria ou de terceiro, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa
imóvel.
(…)
§ 4o Havendo alienações fiduciárias sucessivas da propriedade superveniente, as anteriores terão prioridade em relação
às posteriores na excussão da garantia, observado que, no caso de excussão do imóvel pelo credor fiduciário anterior
com alienação a terceiros, os direitos dos credores fiduciários posteriores sub-rogam-se no preço obtido, cancelando-se
os registros das respectivas alienações fiduciárias.

5 Art. 9o-A Fica permitida a extensão da alienação fiduciária de coisa imóvel, pela qual a propriedade fiduciária já
constituída possa ser utilizada como garantia de operações de crédito novas e autônomas de qualquer natureza, desde
que: (…)