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Por que Tribunais de Justiça vêm autorizando leilão de imóveis gravados com alienação fiduciária para quitar débitos de condomínio?

09/05/2023

As decisões contra os bancos, em desacordo com a Lei 9.514/97 e com o entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) podem tornar o crédito imobiliário mais restritivo e caro ao consumidor.                                                                                                                                                                                                                                     

 

Sancionada em 20 de novembro de 1.997, pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, a Lei nº. 9.514 dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, instituindo a alienação fiduciária de coisa imóvel.

O objetivo da lei foi tornar o crédito imobiliário mais acessível ao consumidor, auxiliar no fomento à economia brasileira por meio da construção civil e reduzir o risco de calote aos bancos, uma vez que a inadimplência passou a ser mitigada pela garantia do próprio imóvel.

Isso porque, no contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, o credor fiduciário – geralmente bancos – possuem a propriedade resolúvel do imóvel, ao tempo em que o devedor fiduciante – consumidor – tem a posse do bem, fazendo o seu direito de uso. Com o término do contrato de financiamento, a propriedade enfim é transferida ao financiado. Caso ocorra o inadimplemento do contrato, o credor fiduciário poderá consolidar o imóvel por meio de diligência junto ao registro de imóveis no qual está inscrita a respectiva matrícula.

Simples, não é mesmo? Portanto, recebo com estranheza decisões recentes de alguns Tribunais de Justiça, especialmente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) que vêm adotando entendimento contrário ao STJ (Tribunal Superior de Justiça) no sentido de permitir a penhora e leilão de imóveis financiados por meio de contratos com garantia de alienação fiduciária para o pagamento de débitos condominiais!

Em uma das decisões, a 27ª Câmara do TJSP, por unanimidade, negou no processo sob nº. 2222298-02.2022.8.26.0000 o pedido do Banco Bradesco para cancelar a penhora de um apartamento na capital paulista, mesmo o Credor Fiduciário sendo proprietário do imóvel que poderá ir a leilão na execução relativa as dívidas do condomínio.

Situação semelhante ocorreu na 33ª Câmara de Direito Privado do mesmo Tribunal de Justiça, na qual os desembargadores negaram por unanimidade o recurso da Caixa Econômica Federal (CEF) que também pleiteava o cancelamento da penhora de um apartamento na região central de São Paulo, processo sob nº. 2011873-60.2023.8.26.0000.

Em decisões recentes os Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) – processo sob nº. 180828-54.2018.8.21.7000, de Goiás (TJGO) – processo sob nº. 180828-54.2018.8.21.7000 e do Mato Grosso do Sul (TJMS) – processo sob nº. 1401272-39.2020.8.12.000 tomaram decisões contra os bancos na posição de credores fiduciários.

No entendimento dos desembargadores a fundamentação das decisões recai sobre a questão social, havendo prioridade para os condomínios pelo fato de que a inadimplência de uma das unidades recai sobre os demais condôminos, além do fato de que os débitos condominiais possuem natureza propter rem, ou seja, estão atrelados ao próprio imóvel.

Porém tais argumentos estão em completo desacordo com julgamentos da 2ª, 3ª e 4ª turmas do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que expressam a impossibilidade de penhora de imóvel para quitação de dívidas de condomínio.

Neste ponto, não restam dúvidas no entendimento do ministro Luis Felipe Salomão no Recurso Especial sob nº. 1992074, quando deixa claro o posicionamento do STJ pela impossibilidade de penhora de imóvel garantia de contrato de alienação fiduciária, pois a sua propriedade não pertence ao devedor fiduciante, e sim a credor fiduciário.

A preocupação é permitir que imóveis gravados por alienação fiduciária sejam leiloados em processos de execução de débitos condominiais, criando de certa forma um Calcanhar de Aquiles para a uma das modalidades de garantia de crédito mais sólidas encontradas hoje no mercado brasileiro, responsável por impactar diretamente o PIB do País, por meio do aquecimento do setor da construção civil.

Nesta modalidade de crédito os bancos operam com spreads menores, possibilitando ao consumidor adquirir um imóvel com taxas de juros mais brandas, se comparadas às demais linhas de crédito oferecidas no mercado, atendendo ao intuito da Lei nº. 9.514/1997 e tracionando a economia brasileira.

Neste sentido, questionada pelo Valor Econômico, a própria Febraban (Federação Brasileira de Bancos) se manifestou em nota informando que “a introdução da garantia de alienação fiduciária de imóveis no Brasil possibilitou um crescimento robusto do crédito imobiliário.” E que “toda a inovação, como a preferência de o condomínio receber os recursos decorrente da penhora do imóvel dado em garantia em detrimento do credor fiduciário, gera incerteza e tem o potencial de afetar todo o mercado imobiliário.”

No País da economia cambaleante, dos níveis recordes de inadimplência e da insegurança jurídica, o que infelizmente vêm fazendo do Brasil um terreno inóspito para investimentos, é preciso que os Tribunais de Justiça dos Estados estejam em acordo com o Superior Tribunal de Justiça. Decisões como estas, acabam sempre por penalizar o bom pagador, que acaba sendo enquadrado na mesma taxa de juros do inadimplente. E o próprio País, com a potencial desaceleração de um dos motores de sua economia, a construção civil.